sexta-feira, 9 de setembro de 2016

"há histórias tão verdadeiras que às vezes parece que são inventadas" - video para ver e rever (valeu, lari!!)





tenho um livro sobre águas e meninos.
gostei mais de um menino que carregava água na peneira.
a mãe disse que carregar água na peneira era o mesmo que roubar um vento
e sair correndo com ele para mostrar aos irmãos.
a mãe disse que era o mesmo que catar espinhos na água
o mesmo que criar peixes no bolso.

o menino era ligado em despropósitos.
quis montar os alicerces de uma casa sobre orvalhos.

a mãe reparou que o menino gostava mais do vazio do que do cheio.
falava que os vazios são maiores e até infinitos.
com o tempo aquele menino que era cismado e esquisito
porque gostava de carregar água na peneira
com o tempo descobriu que escrever seria o mesmo
que carregar água na peneira.
no escrever o menino viu que era capaz de ser
noviça, monge ou mendigo ao mesmo tempo.
o menino aprendeu a usar as palavras.
viu que podia fazer peraltagens com as palavras.
e começou a fazer peraltagens.

foi capaz de interromper o voo de um pássaro botando ponto final na frase.
foi capaz de modificar a tarde botando uma chuva nela.
o menino fazia prodígios.
até fez uma pedra dar flor!

a mãe reparava o menino com ternura.
a mãe falou: meeeeeeu filho, você vai ser poeta!
você vai carregar água na peneira a vida toda.
você vai encher os vazios com as suas peraltagens
e algumas pessoas vão te amar por seus despropósitos .. 

manoel de barros


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